Do quase breu que envolvia a madrugada, ela emergia. Mulher
diva, qual rainha da noite, surgia em todo o seu esplendor puxando-o para uma
dança de fogo. E ele dançava. Era feitiço, o que o levava, naquela viagem de
mistério e aventura através do seu corpo em chamas. De onde vinha, de que reino
encantado emergia, ele não imaginava. Talvez viesse de um qualquer reino
celestial, tão divina era a sua sedução. A lascívia que tão ardentemente
transbordava daquele corpo e daquele espírito só podiam ser dos céus, nunca dos
infernos. Que o inferno jamais ofereceria tanta perfeição… e era perfeito. Oh
se era!
O momento, sempre imprevisível, em que se sentia envolto em
véus. E nas mãos que, tão docemente, lhe acariciavam a pele. Num intenso jogo
de sentidos, desprendia-o de todas as suas roupas, aprisionando-o nas
profundezas das entranhas. Ela, feiticeira de reinos distantes, abria-se em
flor para o receber. Em delírio. Numa permuta de doação total, até às estrelas
que os inundavam de luz. E depois, a alvorada devolvia-a mais uma vez à neblina,
sem qualquer rasto a indicar o seu nome. Só na alma dele. E aí ele chamava-lhe
encanto.
Até àquela madrugada em que, no desabrochar do seu corpo em
flor, ele a viu. A serpente quase invisível ondulando na sua pele. A mesma que
há dias tinha visto no corpo de uma das beatas da sua igreja.